"Fiquei triste. Percebi que demorei tanto pra tomar meu café, que ele esfriou. Percebi também que o mesmo acontece com as pessoas ao meu redor, cansadas de esperar, quando as procuro, já foram embora. É sempre assim, sabe? Quero viver cercada de pessoas, mas preciso e encontro paz só em minha solidão. Quero ser o calor de alguém, mas se eu colocá-lo no meu coração, ele empedra. Sou egoísta, não sei dividir meu silêncio. Egocêntrica. Teimosa. Sei todos os meus defeitos e melhor, não os escondo. Sou de verdade. Apesar de me beliscar às vezes pra constar que sou de carne e osso porque costumo vestir minha armadura por tanto tempo que ela se tornou quase uma segunda pele. Não é fácil tirá-la e deixar minha ferida exposta. E estou aqui em carne viva escrevendo esse texto. Eu decidi que minha vida é dividida em meses, meus meses em dias, dos quais uma quinzena se refere aos bons acontecimentos e a outra, ao meu inferno astral.
É chegada a hora de trocar de pele, sair do casulo, abandonar a armadura. É chegada a hora de sorrir por fora e chorar por dentro. É a hora de dramatizar a existência e lamentar as partidas. É a hora de desocupar as gavetas, a casa e o coração. Mudar, inverter. Eu arrasto bem os móveis da casa, mas me sinto bombardeada por sentimentos estranhos quando tento remover pessoas, não dá. Sempre preferi ouvir “adeus” por não saber lidar com a consciência pesada no meio da noite, caso eu dissesse. Porque, claro, é mais fácil culpar os outros pela nossa infelicidade do que ser totalmente responsável por ela. Eu evito colocar ponto final porque no final, ele acaba virando reticências. E dar continuidade ao sofrimento é masoquismo demais. Viro dor, viro solidão, viro qualquer coisa que me isole do mundo externo e faz eu me recolher no meu mundinho interiorizado. E em mim, só em mim, eu encontro as explicações, razões e motivos.
Maldita quinzena que mais parece um século. Cansa viver, sobreviver, cansa ser humana. Então eu vou mudando minhas cores e me adaptando aos ambientes ou tentando ser invisível à eles. Me esforço pra ser boa, pra ser calma e continuar sendo eu. Reprimo minha mágoa na esperança de que ela suma, mas ainda falta alguns dias. A sensação azeda começa a passar, o amargo da vida tá querendo mudar o gosto e o soco no estômago não sufoca tanto quanto antes. Quando vi o nó na garganta já sumiu e eu estou aqui gritando minha felicidade. Essa sou eu. Vivo em ciclos, fases, fugindo em círculos. Fujo do medo de altura pulando de aviões. E continuo minha rotina mensal, quinzenal, sendo dor, alegria e me vestindo de sentimentos novos. Viver dá um trabalho do cão e ser nós mesmos, às vezes, dói demais."

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Yasmin Braz

Yasmin Braz
[...]Foi então que eu descobri. Ele está exatamente no mesmo lugar que eu agora, pensando as mesmas coisas, com preguiça de ir nos mesmos lugares furados e ver gente boba, com a mesma dúvida entre arriscar mais uma vez e voltar pra casa vazio ou continuar embaixo do edredon lendo mais algumas páginas do seu mundo perfeito. A verdade é que as pessoas de verdade estão em casa. Não é triste pensar que quanto mais interessante uma pessoa é, menor a chance de você vê-la andando por aí? [...] '

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